quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Balé

A garota não sabia dançar.
Não aquela dança de boate,
em que um passo pra cá
e outro pra lá resolve a situação.
Não aquela em que saber dar
um giro bem manjado
ou talvez um rodopio bem aproveitado
seja motivo de glória intensa.
Naquela dança, a menina até
tinha lá os seus talentos,
talvez soubesse apenas não passar vergonha,
mas alguns passos sabia dar.
A dança que ela não sabia dançar era outra.
Era aquela que se baila
da aurora ao alvorecer,
do sol a pino à lua prateada.
Não sabia se era o chão
que era escorregadio,
ou se suas sapatilhas
que lhe apertavam.
Ignorava se era a coreografia
que não lhe agradava,
ou se seus pequenos ouvidos
que com a música não se animavam.
Talvez no fundo, bem no fundo,
ela soubesse a razão.
O melhor bailarino dança no pior piso,
na pior música e até sem sapatilhas.
Quem sabe, quem sabe, seja apenas a garota
que não ainda não viu seus talentos,
ou que ainda não se deixou
dar um passo em falso sozinha.
A garota sabe apenas de uma coisa, claramente.
O teatro anda a se esvaziar,
e ela sabe que um dia, um dia,
se não for dançar, todos os assentos
se esvaziarão, e ela avistará
mais uma vez o espetáculo sozinha,
torcendo para que ninguém a veja,
naquele assento que ninguém quer estar.
Foto: 'Corps' - David Scheinmann
PS. O poema anterior não é gótico. Não é uma apologia ao ódio, muito pelo contrário. As 2 últimas estrofes mostram isso... =)

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